“Bom, estória nasceu três vezes. Primeiro,
nos velhíssimos tempos em que escribas, escrivães e copistas, por ignorância ou
economia, deixavam no tinteiro os agás latinos: aver, ou auer, omem ou ome, oje, ora... Depois, veio a Renascença cheia dos seus latins, e exumaram todos os agás enterrados. E a estória voltou a ser história”.
Depois?
Depois veio o João Ribeiro (jornalista, filólogo, historiador, 1860/1934), e estória nasceu pela segunda vez (1919). Como o inglês tem story e history (“Stories are not History”), aquele escritor sugeriu o
vocábulo arcaico estória, em
terminologia de folclore, para conto da carochinha, lenda popular, etc. Mas o vocábulo ficou em estado de incubação...
Depois? Bom,
depois o arcaísmo nasceu pela terceira vez. Porque veio o Guimarães Rosa, para
glorificar, imortalizar a ausência do agá: Primeiras
estórias. Corriam os anos de 1962. “Primeiras estórias”... todos os fãs do
mineiro imortal ficam absolutamente alucinados. E foi estória pra cá, estória
pra lá, estória pra todos os lados. Uma epidemia. Perdão, uma glória... a
estória. Deu-se até aquele comovente caso do plumitivo* de aldeia que projetou
escrever a “Estória do Município de...”. Não digo o nome do município para não
dar a pista do “estoriador”.
Bem, hoje
estamos neste pé: escritor que se preza não escreve histórias, mas tão-somente
estórias. Pelo menos assim fica tendo alguma coisa em comum com o gênio do Grande Sertão... .
Mas, falando
sério: hoje há duas posições - 1ª) fazer a distinção entre história (o real, acontecido, datado) e estória (o fictício, a ficção) e 2º) manter uma forma única, com h, em qualquer sentido.
Eu? Sou da
simplicidade, da não complicação: história.
Em qualquer sentido. Afinal, ter mais de um significado é a sina da maioria das
palavras. Hoje é o ‘dia corrente’ e
o ‘tempo atual’: quem sabe, a gente opõe um hoje a oje?
Em odo caso,
respeito o uso estilístico, pessoal, de estória."
(*) escritor ou jornalista sem méritos
(Celso Pedro
Luft in “o romance das palavras”, ed.
ática, 1996)
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