2 de novembro de 2013

O Pudim

Claire O. Silva Quirino


Nenhuma outra sensação me marcou tanto na vida afora quanto o doce suave e a textura tenra do pudim de leite da minha avó. Nunca comi nada tão delicioso. A receita é simples e ela a ensinava a quem quisesse. Ninguém, porém, alcançou o resultado a que ela sempre chegava, talvez porque ela própria era suavemente doce e macia, mas surpreendentemente marcante.
O pudim sempre esteve presente, no dia a dia ou nas comemorações familiares. Quando os netos cresceram e saíram para ganhar o mundo, era com o creme que ela nos recebia. Até da nossa última conversa o pudim estava na pauta. "Eu tenho 88 anos! Já não presto pra nada mesmo. Nem um creminho eu posso fazer para receber os netos!" Acho que foi a única vez que a vi de fato se queixando de algo... de não conseguir mais fazer pudim!
Desde que ela se foi, há seis meses, não consigo comer pudim.
Ontem, a imensa saudade levou-me à cozinha. Misturei os ingredientes ouvindo sua voz "o segredo é bater tudo na mão, bem devagar..."  Calda derretida, caldo espumante. Forno ligado, dois dedos queimados. Enquanto o calor cozia aos poucos o doce, eu me recriminava pela ousadia.
Hoje, desenformei a sobremesa e ofereci-a a meus filhos. "Hummm! Eu amei esse pudim, mamãe! Quero mais dois pedaços!" Com os olhos brilhando e cheios de doçura que só as crianças e as avós têm, Bruno me perguntou: "Por que você está chorando, mamãe? Não posso comer mais?"
27/7/2013


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