17 de abril de 2013

Carlinhos



Amigos, amigos de fato. Amigos para todo momento e para todas as aventuras.  Ele morava ali pertinho, apenas três casas abaixo da minha. Seu apelido: Onça. Não sei porque, mas onça não combinava com ele. Nunca o chamei assim. Pra mim era Carlinhos.
Onde quer que fosse ele me acompanhava, nos bons e maus momentos. Nunca deixamos de ser amigos. Tínhamos a mesma idade. Ele, moreno, esguio, falador, sorridente, filho caçula, assim como eu. D. Zica, sua mãe. Austera mas me amava. Seu pai, Sr. Homero, morreu de repente quando brincávamos na sala de sua casa.
Triste lembrança. Fez a barba, nos cumprimentou naquele momento em que estávamos brincando de carrinhos (esses feitos  de madeira  cujas rodas eram  de carretéis vazios, feitos por nós mesmos). Fez a barba, assobiava naquele momento o “Perfumes de Gardênia”. Como ia me esquecer? Saiu do banheiro, sentiu-se mal e olhou pra nós. Foi seu último olhar. Era 1954.
Rodopiou e foi tombando devagar sobre nossos corpos frágeis. A vida se esvaiu. Nós não conseguimos entender o que havia acontecido com ele.
Quando acordamos para a realidade que se nos despertava naquele momento, lá estava ele de mãos cruzadas sobre o peito, ainda o sorriso a estampar-lhe na face.
Muita gente, todos  curiosos  olhando para aquele corpo inerte. Nós não entendíamos aquilo. Fomos para o quintal da casa e continuamos nossas brincadeiras sem perceber o drama que se desenrolava naquele instante.
O pai de Carlinhos. Não o veríamos mais. Ele partiu.
Passaram-se os dias, nossa vida rotineira continuou. Brincadeiras, estudos também, caça aos passarinhos. Vivíamos um mundo que só era nosso e ninguém se adentrava nele.
Como poderia esquecer do Carlinhos? Não poderia nunca, ele  passou a ser  parte de mim. Amigo e companheiro.
Depois de algum tempo mudou-se para São Paulo. Tornou-se motorista de táxi e nunca mais o vi.
Apenas fui informado que ele faleceu no início de 2012 e foi sepultado em Alfenas.
Vejo-o, sim, nas minhas lembranças.

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