Era o
ano de 1965. Ali estava eu servindo o Exército. Minha turma era composta de 78
atiradores. Cada um, um amigo. Mas como éramos diferentes!
Dentre
eles havia alguns tipos inesquecíveis: Scarpa, gordo, esguio, mas não conseguia
fazer barras ou flexões, não suportava nos braços seu próprio peso. Ria de seu
próprio físico. Alair, colega de bancos escolares, muito brincalhão, era o
famoso Pit. Édson, conhecido por Escovão
pelo seu penteado. Zé Augusto, o Gordo, velho amigo de infância com quem
convivi na fazenda de seu pai, meu amigo Genaro Paulino. Netto, Nogueira,
Wilton, Bellini, Sebastião, Pacheco, Damas e tantos outros.
Damas,
ah, ele era muito engraçado na sua humildade. Forte, gostava de mostrar seus
bíceps. Trabalhava na Casa Pinto como motorista de caminhão.
No
primeiro dia de instrução, estávamos em fila no pátio do TG, quando o Sargento
Gonçalves solicitou que os novos atiradores fossem dando um passo à frente, por
ordem alfabética. “Os atiradores cujo nome comece com a letra C, um passo à
frente”, vociferou o Sargento. Damas foi o único a dar um passo à frente.
Sargento Gonçalves, com sua voz de militar, perguntou: “Qual seu nome, atirador?” Damas, imediatamente em posição de sentido
responde em bom tom: “Sebastião, Sargento!”
A gargalhada foi geral.
Mas
houve um fato inesquecível. Resolvemos alguns atiradores assistir a um
espetáculo de luta livre entre mulheres. Era um circo que estava armado num
terreno baldio, próximo ao cemitério, onde hoje se localiza o Ginásio
Poliesportivo.
Éramos
uns 30 atiradores sentados na arquibancada de tábua que, por sinal, não
oferecia muita segurança. No centro do circo estava um ringue onde mulheres musculosas
lutavam entre si, numa espécie de telecatch.
Esse tipo de luta era moda nos circos.
Entre
nós, estava o Pacheco. Forte, cabelos avermelhados, simples e brigão, mas um
ótimo companheiro. Sempre sorridente e alegre. Gostava de contar piadas. Ele dizia
que aquilo tudo “era marmelada para embromar o público”. Claro que ele tinha
razão. Mas era divertido.
O
condutor do espetáculo, em dado momento, grita para a plateia: “Entre vocês há
alguém que queira desafiar uma das garotas? O prêmio para o vencedor será de 30
cruzeiros” (um bom dinheiro na época).
Começamos,
então, a instigar o Pacheco para que aceitasse o desafio. Depois de muita
insistência ele desce da arquibancada e
se oferece como voluntário para a luta.
O
aplauso foi geral e os gritos de incentivo partiam de nossas gargantas entre
vivas e assobios.
Pacheco
subiu ao ringue, de calção e camiseta, mostrando seu físico invejável e seus
braços fortes. Ao centro do ringue ele
ouviu as instruções do juiz. Ele estava calado e com os olhos fixos na mulher
que desafiara.
Começa
a luta! Pacheco mal consegue parar em pé. A mulher o derruba várias vezes e ele
continua impassível diante da surra que levava. Foi num desses momentos que o
juiz se aproximou e disse: “Você não vai reagir?” Pacheco, com uma paciência
incrível, responde: “Não gosto de bater em mulheres.” “Mas você tem que reagir”, explica o
juiz. Pacheco olha para nós e em alto
brado responde? “Então que venham as duas!”
O
riso foi geral. Ele levantou os braços para o público, arrancando aplausos, enquanto as mulheres entravam no ringue.
A luta recomeça. Duas contra um. Pacheco, em
poucos minutos, deixa as duas mulheres estendidas no tablado e indefesas. Vencera!
Descemos
todos das arquibancadas e invadimos o picadeiro. Tomamos Pacheco pelos braços e
o levantamos como um herói, não sem antes receber o prêmio.
Que
noite!
Saímos
dali aos gritos de alegria e fomos para o Bar do Orlando, onde “torramos” os trinta
cruzeiros em cerveja e tira-gosto.